Sistema cooperativista fornece energia para 750 mil municípios
Cooperativas de energia elétrica ampliam sua presença no país, garantindo fornecimento em regiões carentes e protagonizando geração distribuída, eficiência energética e atuação no mercado livre. Concentradas no Sul, investem em fontes renováveis, ampliam redes e viabilizam acesso ao mercado livre. Sua representatividade no fornecimento nacional é pequena em volume, mas o modelo cooperativista, ao promover inclusão e descentralizar o setor, torna-se alternativa viável, fomentando uma matriz mais limpa, eficiente e acessível, segundo a OCB (Organização das Cooperativas Brasileiras).
Elas atendem mais de 750 mil domicílios em 800 municípios – no Rio Grande do Sul, estão em 75% deles -, diversificando fontes e apostando no mercado livre. “As cooperativas têm se consolidado como agentes importantes na ampliação do acesso à energia e na transição para fontes renováveis, especialmente em áreas rurais”, afirma Thayná Côrtes, analista da OCB.
A gaúcha Certel, fundada em 1956, tem 80 mil associados em 48 municípios. “A maioria de nossos consumidores está na área rural, o que é uma marca do cooperativismo gaúcho: o atendimento a pequenas localidades”, diz Erineo José Hennemann, presidente da Certel. Também gaúcha, a Ceriluz atende 24 municípios desde 1966, sendo 100% responsável pelo fornecimento em três deles. “Distribuímos energia elétrica para mais de 14 mil associados, incluindo agronegócio, indústrias, comércio e órgãos públicos”, diz o presidente, Guilherme Schmidt de Pauli.
Em Santa Catarina, a Coopera – que em 2024 sua primeira Pequena Central Hidrelétrica (PCH), com investimento de R$ 75 milhões – fornece energia a mais de 30 mil associados em Forquilhinha, Nova Veneza e Criciúma. A Cogecom, do Paraná, atua na locação de usinas para fomentar investimento privado em energia renovável. “Essa estratégia permite acelerar a expansão da energia limpa sem demandar investimentos em infraestrutura pesada”, diz Roberto Corrêa, CEO. Presente em oito Estados, conecta mais de 50 mil unidades.
Segundo o setor, a tarifa de energia cobrada pelas cooperativas é de 10% a 30% mais barata que a das distribuidoras, podendo superar esses percentuais no mercado livre. Executivos destacam ainda atendimento, agilidade e qualidade da energia ofertada. “Nosso negócio possui gestão e governança mais justas e modernas”, diz Hennemann. De Pauli diz que o senso de pertencimento é um diferencial. “A cooperativa é do associado, portanto, ele prima por sua qualidade.” Enquanto na média nacional consumidores ficaram 10,54 horas sem energia em 2024, segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), associados da Ceriluz ficaram 1h51min sem luz em todo o ano passado.
A Aneel reconhece a relevância das cooperativas para a eletrificação rural. Com o desenvolvimento regional e atualização da legislação, 52 cooperativas foram regularizadas como permissionárias em 2020. Mas o mercado livre e a geração distribuída impõem desafios regulatórios e de escala.
“O ambiente regulado é rigoroso”, diz Hennemann, da Certel. A Ceriluz se queixa de surpresas diárias com questões regulatórias. “Fatores como a abertura do mercado livre para baixa tensão nos prejudicam; precisamos manter o associado na carteira, senão ele migra”, afirma de Pauli. Jean Rafael Fontes, gerente comercial da Cogecom, vê avanços no diálogo regulatório, mas ressalta que “a interlocução ainda se mostra insuficiente frente à relevância do cooperativismo energético”. Ele critica a falta de padronização, que, segundo ele, dificulta a escalabilidade.
Outro entrave citado é regulamentação desatualizada. As cooperativas têm um limite de atendimento (112,5 KVA), que, com o desenvolvimento das áreas rurais, tem sido extrapolado. A OCB afirma trabalhar para que o limite seja ampliado e que cooperativas possam atuar nas áreas urbanas. A OCB destaca que essas entidades já atuam no mercado livre como consumidoras ou geradoras.
De Pauli, da Ceriluz, aponta ainda desafios para expansão da atividade, uma vez que têm atuação geográfica limitada. “Só podemos crescer verticalmente, não conseguimos abarcar mais territórios.” Para contornar essa limitação, algumas oferecem outros serviços, como plano de saúde e seguro residencial.
A Certel, que opera hidrelétricas, estuda ingressar na geração eólica. Porém, a Selic tem impactado os planos. “Temos as menores tarifas do Estado, mas quando se fala em geração de energia você tem que ir além de tarifa justa. Precisamos de prazos maiores [para investimentos], e os juros estão muito altos”, afirma Hennemann.