Quarta-feira, 6 de Agosto de 2025

Para Barroso, agências podem determinar remoção de conteúdo online

O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, abriu a retomada do julgamento sobre a responsabilidade de plataformas digitais sobre o conteúdo dos usuários, nesta quarta-feira, 4, pontuando os principais aspectos dos votos já proferidos. Ao discorrer sobre a tese apresentada por ele mesmo, apontou que as hipóteses em que deve haver remoção de conteúdo mesmo sem ordem judicial incluem o caso de determinação vinda de agência reguladora.

Barroso usou a Anvisa como exemplo ao citar o trecho de seu voto sobre o regime de notificação extrajudicial para retirada de conteúdo, o qual ele entende que deve valer para crimes em geral, exceto aqueles contra a honra (o que se aplica a casos de reportagens investigativas). Neste caso, ele afirma que tal notificação “pode ser privada ou pode ser até pela administração pública, pela Anvisa, por quem seja”.

Os casos que já envolveram a Agência Nacional de Vigilância Sanitária incluem, por exemplo, o anúncio de produtos proibidos, como cigarros eletrônicos. Já houve também o uso fraudulento de logo da autarquia em conteúdos de desinformação.

A segurança jurídica de medida aplicada por agência reguladora faz parte de disputa judicial atualmente em curso entre a Anatel e plataformas de comércio eletrônico pela venda de produtos sem homologação.

A construção do voto de Barroso, no entanto, ainda não é tão expressa em relação ao alcance ou delimitação dos tipos de provedores de aplicação sujeitos à regra, como é o posicionamento de um dos relatores, Dias Toffoli, que além de tratar de redes sociais, endereça responsabilidade objetiva e solidária especificamente de plataformas de marketplaces com seus anunciantes em caso de venda proibida, incluindo itens sem certificação ou homologação.

 ‘O Judiciário não está regulando’

Ao retomar a votação sobre o tema, que estava suspensa desde dezembro do ano passado, Barroso destacou ser necessário detalhar as circunstâncias do julgamento para evitar a desinformação. “O Judiciário não está legislando e, muito menos, regulando em caráter geral, abstrato e definitivo as plataformas digitais. Nós estamos julgando pretensões que chegaram ao tribunal por via de recursos”, ressaltou.

O STF analisa dois recursos – um do Facebook e outro do Google – nos quais as empresas tentaram anular entendimento firmado em instâncias inferiores de que seriam responsabilizadas com dever de arcar com danos morais e excluir conteúdo (no caso do Google, comunidade no Orkut criada para ofender uma professora e; no caso do Facebook, exclusão de perfil falso que desacatou familiares da pessoa alvo de conta fake).

A análise do caso envolveu a avaliação da principal legislação aplicável, o Marco Civil da Internet, que prevê, em seu Artigo 19, que “com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário”.

Barroso destacou que o Artigo 19 não é único dispositivo do Marco Civil da Internet em análise. O Artigo 21 também é analisado – o qual determina que: “provedor de aplicações de internet que disponibilize conteúdo gerado por terceiros será responsabilizado subsidiariamente pela violação da intimidade decorrente da divulgação, sem autorização de seus participantes, de imagens, de vídeos ou de outros materiais contendo cenas de nudez ou de atos sexuais de caráter privado quando, após o recebimento de notificação pelo participante ou seu representante legal, deixar de promover, de forma diligente, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço, a indisponibilização desse conteúdo”.

O protagonismo do Artigo 19 se dá por ser o que expressamente relaciona limites de discricionariedade para garantir a liberdade de expressão e por, ao ser considerado inconstitucional, ensejar a necessidade de critérios de remoção – parte desses critérios já previstos no Artigo 21, o qual os ministros debatem em quais hipóteses e termos aplicar.

Participação social

A principal audiência pública sobre o caso foi realizada em 2023, ouvindo dezenas de participantes, entre especialistas, entidades da sociedade civil, associações de empresas, órgãos públicos e as maiores plataformas digitais a nível mundial. No entanto, o julgamento não começou naquele ano, visto a então expectativa de debate sobre o tema no Congresso Nacional, que acabou travada por falta de consenso.

O julgamento, então, começou em novembro de 2024, com o voto dos relatores, seguido do posicionamento de Barroso e suspenso por pedido de vistas de André Mendonça. Naquela ocasião, o presidente do STF já tinha dado ênfase à tentativa de aguardar o Legislativo a tratar do tema antes de prosseguir com o julgamento. Nesta tarde, ele reforçou o mesmo ponto.

“No Brasil, para quem não tenha essa informação, um tribunal não tem a possibilidade de dizer: ‘Esse tema é muito complexo, vai trazer chateação, vamos contrariar muita gente”, ou tampouco: ‘Já que não tem lei a respeito, eu não julgo’. […] Pelo contrário, a lei de introdução diz assim: “Quando a lei for omissa, ‘o juiz decidirá o caso’, no imperativo, ‘de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito’. Por evidente, para nós decidirmos os casos concretos colocados perante o tribunal, nós precisamos estabelecer os critérios que vão pautar o julgamento”, disse.

Pedido da AGU

Mendonça liberou o voto na semana passada, no mesmo dia em que a AGU divulgou um pedido para que o Supremo obrigue as plataformas digitais a adotarem uma série de medidas para mitigar danos efetivos ou potenciais de determinados conteúdos na internet. O instrumento utilizado, chamado de pedido de tutela de urgência incidental, poderia admitir uma decisão provisória individual de Toffoli que valeria até o julgamento coletivo, em plenário, fosse concluído.

Nesta tarde, Toffoli contou durante a sessão que nem chegou a analisar o pedido da AGU, visto que Mendonça liberou o voto e Barroso sinalizou a ele que retomaria a análise em plenário já nesta semana.

Este primeiro dia de continuidade do julgamento foi dedicado a uma parte do voto do ministro André Mendonça. Há previsão de que ele conclua seu posicionamento nesta quinta-feira, 5.

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