Os 10 princípios propostos pelo CGI.br para regular redes sociais
O CGI.br (Comitê Gestor da Internet no Brasil) apresentou nesta terça-feira, 27, uma proposta de 10 princípios para nortear a regulação de redes sociais, abarcando questões conceituais que impactam os modelos de negócio e a proteção de usuários. O anúncio acompanha a abertura de consulta pública sobre o texto, que receberá contribuições até 17 de junho, pela plataforma Diálogos.
Os princípios são:
1 – Soberania e segurança nacional: as atividades devem respeitar a Constituição Federal e o ordenamento jurídico do brasileiro.
2 – Liberdade de expressão, privacidade e direitos humanos: observando “a privacidade, igualdade, o direito à não discriminação e a proteção absoluta aos direitos da criança e adolescente, buscando combater a incitação à violência, ao discurso de ódio e a todas as formas de discriminação nas plataformas digitais”.
3- Autodeterminação informacional: o que envolve “promover meios que permitam aos usuários decidir quando, como e em que medida seus dados pessoais podem ser coletados, usados, armazenados e compartilhados, inclusive nos processos de perfilização, moderação e recomendação de conteúdos”.
Neste âmbito, discute-se também “o direito de usuários e grupos escolherem a que informações querem ter acesso, como o padrão da oferta de conteúdos que lhe é destinada com base em seus dados pessoais”. Além disso, recomenda que a regulação promova “a garantia da preservação da memória, determinando a criação de mecanismos para organizar e armazenar conteúdos – mesmo que não disponíveis ao público, para fins de pesquisa e registro histórico”.
4 – Integridade da Informação: exigindo “proteger o direito à informação e promover a precisão, consistência e confiabilidade dos conteúdos, dos processos e dos sistemas de informações”, e considerando que “para a manutenção de um ecossistema saudável e seguro devem ser promovidas informações de qualidade; conteúdos jornalísticos e científicos; e políticas de preservação da memória e de enfrentamento a fraudes e desinformação”.
5 – Inovação e desenvolvimento social: incorporando o aspecto econômico e tecnológico, “possibilitando a geração de renda, visibilidade de produtos e serviços, novas formas de trabalho decente e dinamização da economia digital, especialmente para pequenos empreendedores, criadores de conteúdo, prestadores de serviços autônomos e negócios locais”.
“A regulação deve fomentar um ambiente digital que sustente múltiplas alternativas tecnológicas, garantindo que indivíduos, grupos, comunidades e empresas possam criar e manter modelos que facilitem uma existência econômica digna, que valorize a colaboração, o bem comum e outras formas de geração de valor”, consta na proposta.
6 – Transparência e prestação de contas: em relação aos “sistemas de moderação (inclusive quanto à composição das equipes de moderação), algoritmos de recomendação e políticas de impulsionamento e monetização”, incluindo “meios adequados de participação e verificação nas remoções de conteúdos, por padrões abertos e padronizados (quando aplicável) e aberturas qualificadas de dados relevantes para pesquisadores independentes e autoridades públicas”.
7 – Interoperabilidade e portabilidade: como direitos aos usuários. Na descrição, o CGI.br explica que “deve ser possível solicitar, a pedido do titular dos dados, a transferência de dados em um formato estruturado, comumente usado e legível por máquina”. Para o comitê, “a regulação deve promover, considerando os desafios técnicos e responsabilidades legais, a capacidade de diferentes serviços digitais trabalharem juntos e se comunicarem entre si, o emprego de protocolos e padrões abertos, permitindo que os usuários combinem vários serviços com funcionalidades complementares, inclusive por meio de obrigações que permitam a portabilidade em tempo real, de forma que o conteúdo possa ser lido e processado de forma instantânea e automática por computadores e sistemas digitais distintos”.
8 – Prevenção de danos e responsabilidade: o que significa que as plataformas de redes sociais “devem envidar seu melhor esforço para prevenir e precaver os potenciais danos decorrentes de suas atividades, sobretudo aqueles advindos da circulação de conteúdos”, pois são “responsáveis pelos danos decorrentes de riscos sistêmicos inerentes ao serviço prestado, devendo repará-los ou mitigá-los”.
Como “danos decorrentes de riscos sistêmicos” consideram-se “aqueles causados pelo ambiente da rede resultante de suas políticas de transparência, moderação (incluindo ações de redução de alcance ou ocultamento), recomendação e impulsionamento de conteúdos”.
9 – Proporcionalidade regulatória: ou seja, “reconhecer a pluralidade de atores no ecossistema digital, prevendo obrigações de acordo com as diferenças de porte e impacto das plataformas, adotando modelos assimétricos e proporcionais que considerem os riscos decorrentes das atividades”.
10 – Ambiente regulatório e Governança Multissetorial: por fim, que “a regulação das redes sociais deve se basear em um arranjo institucional que envolva uma governança multissetorial e órgãos independentes dotados das necessárias capacidades para sua atuação, a exemplo de capacidade técnica e fiscalizatória”.
Debate sobre princípios do CGI.br
Os 10 princípios foram apresentados nesta tarde, durante o 15º Fórum da Internet no Brasil (FIB), em Salvador/BA, evento que proporcionou o primeiro debate sobre a proposta. Um dos participantes, o secretário de Políticas Digitais da Secom, João Brant, afirmou que as ideias estão alinhadas com o que vem sendo discutido no âmbito do governo federal. “Tenho a impressão de que os projetos que vão ser trazidos pelo governo federal gabaritam os princípios”, afirmou.
Brant se refere às propostas que dizem respeito a questões concorrenciais no mercado digital e às redes sociais, que terão cada uma tramitação individual, passando pelo Congresso Nacional.
“O governo segue achando que é o Congresso Nacional que deve tomar as decisões de forma equilibrada, mas também segue achando que é preciso um impulso para que esse debate aconteça. E esse impulso o governo está disposto a promover em um projeto de lei sobre serviços digitais, pensando justamente nesses serviços que promovem a intermediação com conteúdos, produtos ou serviços de terceiros, e também um que aumenta a capacidade de respostas institucionais, para ampliar a competição no ambiente digital”.
Quanto às questões concorrenciais no mercado digital, o debate vem sendo coordenado pelo Ministério da Fazenda, responsável por consulta pública e estudo de diagnóstico. A proposta para outros aspectos, por exemplo a proteção dos usuários, envolve a participação mais próxima do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Apesar disso, Brant ressaltou que as propostas estão sendo construídas ouvindo também outros órgãos.
O lado das plataformas
Representando as empresas de tecnologia, Sérgio Garcia Alves, Gerente de Políticas Públicas no Brasil da Associação Latino-Americana de Internet (ALAI), entende que há pontos da proposta do CGI.br que precisam ser mais bem delineados.
“Princípios como o de interoperabilidade e portabilidade, e a linguagem sobre responsabilização, sobre riscos sistêmicos, a gente ainda não sabe exatamente qual é o significado. […] Não temos muita clareza de que riscos são esses, como que um sistema de responsabilização pode ser derivado de um arranjo dessa natureza”, afirmou Alves.
Sobre os aspectos relacionados à regulação econômica das plataformas digitais, Alves afirma que a associação ainda não teve acesso ao texto que está sendo construído pelo governo, mas avaliou bem a separação desse tema das questões sobre proteção de usuários. “Talvez a solução que o Executivo ensaia de ter textos separados possa ser mais eficiente”, disse.