O Custo do Futuro: Dívida, Consolidação e Sustentabilidade no Setor de Telecom
*Por José Felipe Ruppenthal – Hoje eu poderia estar aqui falando sobre os números do crescimento da banda larga fixa no Brasil.
Poderia comentar o avanço dos acessos, as pequenas mudanças no market share ou até as perspectivas apresentadas nos inúmeros eventos que movimentaram o setor neste mês de outubro: de IoT, satélites e data centers a cabos submarinos e inteligência artificial.
Mas há um tema que raramente ganha destaque nas estatísticas macro: o nível de endividamento das operadoras de telecomunicações do Brasil.
Ele aparece quase sempre nos relatórios financeiros das operadoras e nos informes aos investidores, mas é um dos indicadores mais reveladores sobre a real sustentabilidade do setor.
Ter dívida ou até níveis elevados de alavancagem não é necessariamente um problema no setor de telecom. Em muitos casos, é o que viabiliza expansão, consolidação e ganho de escala.
O ponto é que o cenário brasileiro atual combina Selic nas alturas, crédito caro e um mercado em busca de consolidação. E essa combinação cria o que talvez seja o maior ponto de inflexão da década para as telecomunicações no país.
O setor precisa se reorganizar para seguir crescendo, e o foco, inevitavelmente, passa pela banda larga fixa, que continua sendo a espinha dorsal da conectividade no Brasil.
É justamente nesse ponto que o endividamento se torna mais revelador: a maioria dos ISPs mais alavancados tem sua base de negócios concentrada na banda larga fixa.
E, ao mesmo tempo, muitos veem no mercado móvel o próximo passo natural de crescimento.
Mas há um desafio que poucos querem encarar: o mercado móvel exige um nível de investimento muito superior em espectro, infraestrutura e operação, que talvez as atuais estruturas de dívida não comportem.
Ao mesmo tempo, esses grandes consolidadores que enxergam na rede móvel um caminho natural de expansão são, por essência, players que precisam continuar adquirindo para sustentar o ritmo de crescimento e ganho de mercado.
Ir para outros caminhos, como data centers, também exige alto nível de investimento.
Só que os fundos de investimento que compõem o capital dessas operações já começam a bater à porta cobrando seus retornos e muitos desses ciclos de investimento completam agora quatro a cinco anos, o famoso exit.
Enquanto as grandes operadoras mantêm níveis de endividamento controlados, boa parte dos ISPs opera acima de 3x EBITDA, um sinal de alerta sobre a capacidade de financiar a próxima onda de crescimento, especialmente porque foram eles, até aqui, os principais consolidadores do mercado.
As perguntas que ficam são:
Como seguir expandindo com capital caro, margens comprimidas e um apetite crescente por mobilidade, dados e IA?
Será que os ISPs vão conseguir contornar essa grande jornada de inflexão?
O cenário econômico pode ajudar no futuro ou os consolidadores passarão a ser consolidados?
As minhas apostas precisariam “passar” por muitos RIs de operadoras (rss)!
Nos vemos mês que vem!
José Felipe Ruppenthal é CEO da consultoria Telco Advisors e todo mês traz ao Tele.Síntese sua análise sobre o mercado de telecomunicações na coluna Etc. & Thal.