Quinta-feira, 7 de Agosto de 2025

México: nova lei de telecom é aprovada no Senado após remoção de pontos polêmicos

O Senado do México aprovou a nova Lei de Telecomunicações e Radiodifusão, que substituirá a legislação em vigor desde 2014. Com 77 votos a favor e 30 contra, o projeto segue para a Câmara dos Deputados para análise.

A iniciativa, promovida pelo governo da presidenta Claudia Sheinbaum, foi modificada após cinco rodadas de debates legislativos que contaram com a participação de 89 especialistas dos setores público, privado e acadêmico.

Entre as mudanças mais relevantes está a eliminação do artigo que permitia o bloqueio de plataformas digitais e a criação de um novo órgão regulador com estrutura colegiada.

Segundo o texto aprovado, a lei busca modernizar e digitalizar os trâmites regulatórios, reduzir duplicidades e promover maior coordenação entre instituições. A reforma faz parte da estratégia de atração de investimentos e de nearshoring, sendo considerada fundamental para facilitar a expansão da infraestrutura de conectividade.

Surge a Comissão Reguladora de Telecomunicações (CRT)
A nova CRT será um órgão descentralizado, com autonomia técnica, operacional e de gestão. Substituirá o IFT em funções centrais, como administração do espectro, concessões, regulação de internet, radiodifusão e serviços via satélite, além de fiscalizar o cumprimento das normas.

Será composta por cinco comissários indicados pelo Executivo e ratificados pelo Senado, com mandatos de sete anos, não renováveis. O Plenário será o órgão máximo de decisão.

Embora não tenha a autonomia constitucional do IFT, seu desenho busca evitar a concentração de poder em uma única pessoa, como foi criticado na proposta inicial da Agência de Transformação Digital e Telecomunicações (ATDT).

O texto final reintroduz contrapesos institucionais e confere à CRT instrumentos regulatórios como sanções, definição de tarifas de interconexão, emissão de normas técnicas e chamadas para licitação de espectro. Também terá atribuições em acessibilidade, inclusão digital e direitos das audiências.

Além das funções da CRT e da formulação de políticas públicas pela ATDT, o novo marco cria a Comissão Nacional Antitruste (CNA), órgão público descentralizado vinculado ao Ministério da Economia, que substitui a extinta Cofece.

A CNA terá poder para investigar, sancionar e prevenir práticas anticompetitivas, regular a concentração de frequências e a propriedade cruzada de meios de comunicação. Poderá ainda ordenar a desincorporação de ativos para garantir a concorrência, função antes atribuída ao IFT. Também contará com cinco comissários, e sua presidência será indicada pelo Executivo.

Propostas de censura foram retiradas, mas há alertas sobre vigilância
O polêmico artigo 109, que permitia o bloqueio temporário de plataformas digitais, foi excluído da lei. Também foram alteradas disposições que davam amplos poderes à ATDT sobre conteúdos e supervisão de meios.

Contudo, permanece a possibilidade de a nova comissão ordenar a suspensão cautelar de transmissões publicitárias estrangeiras que descumpram normas, após notificação.

Outro ponto que causa preocupação é o artigo 183, que obriga operadoras a colaborar com a geolocalização em tempo real de celulares, nos mesmos termos da lei de 2014. Não cria novos mecanismos de vigilância, mas mantém a exigência de cumprir ordens judiciais conforme o Código Nacional de Procedimentos Penais.

Ricardo Anaya, líder do PAN, criticou essa disposição, chamando-a de risco de “Estado espião”. Já parlamentares como Jorge Carlos Ramírez Marín e do PVEM argumentaram que não há novidades, apenas manutenção de regras antigas para colaborar com a Justiça.

José Merino, da Agência Digital de Inovação Pública, reforçou que isso exige autorização judicial, como já previsto no Código. Por outro lado, a Rede em Defesa dos Direitos Digitais (R3D) alertou que a lei obrigará operadoras a vincular linhas à CURP (cadastro de pessoas físicas no México) ou cancelar o serviço, e que esses registros poderão ser acessados por autoridades via legislações de segurança e inteligência.

Participação do Estado e neutralidade competitiva
A lei reconhece o Estado como prestador de serviços de conectividade em igualdade de condições com o setor privado. A CFE poderá operar redes em áreas remotas mediante concessões ou prestação direta, acessando espectro condicionado ao cumprimento de metas periódicas de cobertura. Não fica claro se isso envolverá parceria com a Altán Redes.

O Instituto de Administração e Avaliação de Bens Nacionais (INDAABIN) poderá permitir o uso de bens federais — torres, servidões, infraestrutura — para implantação de redes, seguindo critérios técnicos, sociais e econômicos definidos pelo Executivo.

Concessões de uso social, comunitário, indígena e afro-mexicano terão baixo custo e poderão comercializar até 3% do tempo com publicidade local, além de receber parte do orçamento de comunicação social. Precisarão apresentar relatório anual de atividades e estrutura acionária.

Para reduzir a exclusão digital, haverá descontos ou isenções em pagamentos pelo uso do espectro para pequenos operadores e concessões sociais, especialmente em áreas rurais ou de difícil acesso, medida bem recebida nos debates legislativos.

Meios sociais sem fins lucrativos poderão acessar publicidade oficial e contar com mecanismos orçamentários próprios para garantir a sustentabilidade.

Operadoras serão obrigadas a entregar aparelhos desbloqueados e permitir recargas com qualquer fornecedor. Serviços de emergência devem ser gratuitos, e chips só poderão ser ativados com apresentação de documento oficial.

A lei estabelece ainda medidas de acessibilidade digital, exigindo que sites e apps públicos sejam inclusivos para pessoas com deficiência, e reconhece o direito de mulheres e meninas a se conectarem em condições de igualdade.

Em zonas urbanas, cria-se um “sandbox regulatório” para testes piloto de tecnologias sob regras flexíveis e prevê a progressiva substituição de cabos aéreos por subterrâneos.

Organizações como a Observatel, presidida por Irene Levy, alertam que, apesar de se falar em neutralidade competitiva, a falta de separação clara entre o Estado regulador e o operador pode gerar conflitos de interesse.

Por outro lado, destacam avanços como a eliminação do registro nacional obrigatório de usuários de celular, substituído por um mecanismo de identificação apenas no momento da compra do chip.

Cobertura, inclusão e meios comunitários
O novo marco normativo cria incentivos para expansão da banda larga em regiões marginalizadas, incluindo descontos no espectro e apoio a pequenos provedores, comunitários, indígenas e afro-mexicanos.

Restabelece direitos das audiências revogados em 2017 e valoriza o papel dos meios sociais sem fins lucrativos, que poderão receber recursos públicos e vender até 3% do tempo publicitário para anunciantes locais.

Fortalece também exigências de acessibilidade para pessoas com deficiência e amplia conteúdos de interesse público.

O que falta para a Lei de Telecomunicações do México entrar em vigor?
Agora o projeto segue para debate na Câmara dos Deputados. Se for aprovado sem alterações, será promulgado no Diário Oficial da Federação, entrando em vigor. A partir daí, começará a formação do Plenário da CRT e a elaboração das normas secundárias.

A extinção do IFT será formalizada após essa publicação, dando início à transição para a CRT e à redistribuição de competências entre as novas autoridades do setor.

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