Quarta-feira, 6 de Agosto de 2025

Governo do México cede à pressão e altera nova lei de telecomunicações

Após semanas de debate público e críticas de especialistas, concessionárias, ativistas e defensores de direitos das audiências, o governo federal e os legisladores da base governista (Morena, PT e PVEM) do México chegaram a um acordo sobre uma série de mudanças na nova Lei de Telecomunicações.

As correções buscam evitar a concentração de funções na Agência de Transformação Digital e Telecomunicações, atender preocupações sobre censura e concorrência desleal, e evitar violações ao Tratado entre México, Estados Unidos e Canadá (T-MEC).

Um dos pilares centrais do acordo é a fragmentação das funções que, na última década, estavam concentradas no Instituto Federal de Telecomunicações (IFT), responsável pela regulação do setor. O novo modelo institucional propõe dividir essas atribuições entre três diferentes entidades, com o objetivo de reequilibrar o poder regulatório e garantir princípios de concorrência, neutralidade tecnológica e transparência.

As alterações ao projeto da Lei de Telecom não surgiram exclusivamente do Senado, mas de um acordo entre o governo federal e os senadores da base governista.

A Consultoria Jurídica da Presidência, chefiada por Ernestina Godoy, junto com a Agência de Transformação Digital e Telecomunicações, liderada por José Merino, apresentaram as propostas de ajuste aos legisladores do Morena, PT e PVEM. Essas serão incorporadas ao parecer que será analisado pelas comissões unidas do Senado, encarregadas de emitir parecer antes que a proposta possa ser discutida e eventualmente votada no plenário.

O parecer modificado será discutido nas comissões do Senado nas próximas semanas e poderá ser votado durante um período extraordinário de sessões a partir de 23 de junho.

Divisão das competências do IFT

A proposta revisada contempla a criação da Comissão Reguladora de Telecomunicações (CRT), um órgão público descentralizado com independência técnica, operacional e de gestão. A comissão será composta por cinco comissários indicados pelo Executivo e ratificados pelo Senado, e será responsável por conceder e administrar concessões de espectro radioelétrico e recursos orbitais — incluindo serviços de internet, rádio, televisão e satélite — bem como regular os serviços de telecomunicações e radiodifusão, e fiscalizar seu cumprimento.

Por outro lado, as competências em matéria de preponderância e concorrência econômica serão atribuídas a uma nova Comissão Nacional Antitruste, criada com base na Lei de Concorrência Econômica. Este órgão será encarregado de aplicar regulação assimétrica, intervir em mercados concentrados e fiscalizar abusos de posição dominante, funções anteriormente atribuídas ao IFT.

A Agência de Transformação Digital e Telecomunicações, liderada por José Merino, continuará sendo a executora da política pública em temas de cobertura social, conectividade satelital, administração da infraestrutura digital e do espectro. No entanto, não será mais a única entidade com funções regulatórias, como proposto originalmente.

Correções para cumprir o T-MEC

Um dos aspectos mais críticos do projeto inicial era a possibilidade de o Estado prestar serviços de telecomunicações sem precisar de concessão comercial, violando o princípio de neutralidade concorrencial previsto no capítulo 18.18 do T-MEC.

Para evitar essa infração, o novo parecer estabelece que, caso o Estado mexicano deseje atuar como operador final (por exemplo, de internet ou telefonia), deverá obter uma concessão comercial, participar de licitações públicas em igualdade de condições com o setor privado e pagar a devida contraprestação. Essa medida visa garantir condições equitativas no setor, evitar concorrência desleal e proteger os compromissos internacionais do México.

Mudanças em conteúdo, direitos das audiências e espectro

O novo texto também elimina várias disposições que causaram preocupação por possíveis impactos na liberdade de expressão e pluralidade informativa. Entre as mudanças mais relevantes está a exclusão do artigo 109, que permitia o bloqueio de plataformas digitais sem ordem judicial, e dos artigos 201 e 202, que condicionavam a transmissão de conteúdos estrangeiros à aprovação prévia da Secretaria de Governo.

Foram também eliminadas as definições de “provedor de plataformas digitais” e “serviços digitais”, embora a definição geral de plataformas digitais tenha sido mantida, visando possibilitar futura regulamentação específica.

No que diz respeito aos direitos das audiências, o texto vigente do artigo 8 foi restituído, eliminando a possibilidade de sanções automáticas. Agora, só será permitida a suspensão de transmissões de forma cautelar mediante advertência prévia em casos de infrações graves, especialmente em conteúdo voltado ao público infantil.

Também foi retirada a obrigação do “uso correto da linguagem” por concessionárias, cláusula ambígua apontada por especialistas como risco à liberdade editorial.

Como parte das medidas para ampliar a inclusão digital e favorecer a conectividade em áreas marginalizadas, o novo texto incorpora incentivos a operadores sociais, públicos e comunitários. Entre eles, a possibilidade de parcelar o pagamento de concessões públicas de radiodifusão em anuidades nos primeiros cinco anos de vigência.

Além disso, operadores indígenas, comunitários ou de uso social ficam isentos do pagamento de taxas, desde que prestem serviços em zonas sem cobertura ou prioritárias. Introduz-se ainda a possibilidade de obter descontos no pagamento por uso do espectro em troca de compromissos de cobertura populacional.

Quanto ao regime de concessões, o texto estabelece novos controles societários, como a obrigação de informar anualmente sobre sócios e associados, a exigência de autorização prévia para mudanças estruturais e a possibilidade de revogação da concessão caso sócios não autorizados sejam incorporados. Essas medidas visam fortalecer a supervisão do setor e garantir que as concessões sigam dentro do marco legal.

O que não muda na nova Lei de Telecom

Apesar dos ajustes, alguns pontos do projeto original permanecem. O custo atual do espectro radioelétrico não será modificado, sob o argumento de que seu valor real caiu nos últimos anos. Também se mantém a definição de plataformas digitais e não são incorporados novos princípios como liberdade de escolha, não discriminação e proteção da privacidade — temas que poderão ser abordados em futura legislação.

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