Governo ajusta abordagem em nova proposta para regular redes sociais
O governo federal precisou corrigir a abordagem atribuída à regulação das plataformas de redes sociais ao longo da discussão no Congresso Nacional. Evitando o desvio do tema para viéses que colocam a regulamentação como uma antítese da liberdade de expressão ou da brusca interrupção do acesso às redes, a principal preocupação será “dialogar com a realidade das pessoas nas suas casas”, disse João Brant, secretário de Políticas Digitais da Secom, em debate sobre o tema no 5º Congresso Brasileiro de Internet, nesta quinta-feira, 22.
Essa realidade é a que se reflete na vulnerabilidade dos usuários a crimes digitais. “Nós estamos vendo o crescimento de golpes e fraudes na internet numa linha que não para”, exemplificou Brant.
A secretária de Direitos Digitais do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), Lilian Cintra de Mello, chama atenção para outra demanda comum, que é a de proteção de crianças e adolescentes.
“A Polícia Federal recebe diariamente 2,7 mil denúncias de conteúdo de abuso sexual infantil no digital. E a gente sabe que esse número é a pontinha do iceberg. Precisamos resolver essas questões”, afirmou Mello.
A secretária entende que uma síntese justa das propostas que estão sendo construídas pelos órgãos do governo para serem submetidas ao crivo dos parlamentares é, basicamente, “levar para o ambiente digital as proteções que a gente já tem em outros espaços e transformar a internet num lugar mais seguro, para que continue sendo também um espaço de inovação”.
Como qualquer regulação, a proposta precisa prever medidas sancionatórias, e uma delas, em último caso – após reincidentes descumprimentos de diretrizes de proteção e responsabilidade –, seria o bloqueio da plataforma.
Brant, por sua vez, reforçou que embora exista uma corrente política que busca afastar qualquer regra sobre “conteúdo”, o termo está intrínseco ao ambiente digital.
“Violações como violência sexual infantil é conteúdo. Quando a gente fala de golpes e fraudes, isso também é conteúdo. Então, sim, vamos discutir conteúdo. Vamos discutir se o que o projeto está apresentando é ou não legítimo diante do próprio ordenamento jurídico brasileiro”, disse o secretário.
Ao longo do dia de debates nesta tarde, promovido pela Abranet, diversos representantes do setor público e privado reconheceram que o principal desafio da discussão sobre a regulação das plataformas digitais se tornou o da narrativa, para que a nova proposta não receba, mais uma vez, o apelido de “PL das Fake News” e seja barrado por quem dissemina desinformação.
Entidade reguladora
A definição de uma entidade reguladora, que foi um dos pontos que impediu a aprovação do PL 2630/2020 na Câmara dos Deputados, não deve ser totalmente respondida na proposta que está em discussão no governo. Sugere-se, por enquanto, apenas atribuir essa definição a um ato posterior.
Para Renata Mielli, coordenadora do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), a regulação deve estabelecer uma “arquitetura regulatória distribuída”, reconhecendo o papel do CGI.br na gestão dos domínios “.br”, assim como o da Anatel, como elo para operacionalizar medidas necessárias em caso de descumprimento de regras – como a suspensão temporária das plataformas, como já ocorreu outras vezes no país, a partir de ordem judicial –, entre outros órgãos reguladores, incluindo a ANPD.
Já o presidente da Anatel, Carlos Baigorri, sem necessariamente defender o protagonismo centrado na agência, entende que deve haver uma ampliação das competências da autarquia no ambiente digital, por conta da posição que só ela tem entre determinações e infraestrutura.
“A única forma de dar efetividade para qualquer marco legal regulatório no ambiente digital é se tiver uma forma de impedir que os usuários, os cidadãos, tenham acesso àquele conteúdo. E a única forma de fazer isso é por meio da infraestrutura que dá acesso ao mundo digital, que é a infraestrutura de telecomunicações”, concluiu Baigorri.