Quarta-feira, 15 de Outubro de 2025

Brasil pode enfrentar colapso no acesso à energia para data centers, alerta executivo da Scala

O avanço da digitalização e o aumento da demanda por processamento de dados estão colocando o Brasil diante de um risco energético inédito. A advertência vem de Luciano Fialho, vice-presidente sênior de Corporate Development e M&A da Scala Data Centers, que alertou para a possibilidade de um colapso no acesso à energia elétrica destinada à operação de data centers no país.

Durante a mesa “Conectividade e Energia para Data Centers”, moderada por Luciano Charlita, do Banco Mundial, Fialho afirmou que o número de pedidos de conexão à rede básica de energia já ultrapassa a capacidade real e a demanda projetada para o setor. O executivo defendeu que o governo e os órgãos reguladores criem mecanismos para evitar a reserva de capacidade por empresas que não operam efetivamente data centers.

O executivo ainda completou: “Existe agora um problema para ser resolvido pelo Ministério de Minas e Energia, pela Aneel, pela ONS e pela EPE: como lidar com quem está se aproveitando da oportunidade para pedir conexão à rede sem ser operador de data center, atravessadores”, afirmou Fialho. “Se eu pedisse hoje para conectar outros 500 megawatts, teria um problema sério. Já são quase 30 gigas de pedidos de conexão, e esse mercado não existe no Brasil”.

Descompasso entre geração e transmissão ameaça o setor
De acordo com o executivo, há um desequilíbrio estrutural entre o ritmo de expansão dos data centers e o tempo de implantação da infraestrutura elétrica necessária. Enquanto um data center pode entrar em operação em 12 a 18 meses, a construção de linhas de transmissão pode levar de cinco a sete anos, entre o leilão e a conclusão da obra.

“O tempo para se construir uma linha de transmissão entre o leilão e o final da obra é de cinco a sete anos, enquanto o tempo para acender um site de data center é de 12 a 18 meses. Esse é o problema que vamos enfrentar”, alertou Fialho.

Esse descompasso representa um desafio estratégico para o Brasil. Caso o país não alinhe o crescimento do setor de tecnologia à expansão do sistema elétrico, há risco de bloqueio de novos investimentos, aumento de custos e perda de competitividade internacional.

Brasil pode repetir gargalos dos Estados Unidos
Ao comparar o cenário brasileiro com o dos Estados Unidos, Fialho chamou atenção para o colapso enfrentado por Ashburn, na Virgínia, uma das regiões mais densas em data centers do mundo. Lá, a limitação da rede elétrica já impede novas conexões e atrasa projetos de expansão.

“Se nada for feito, nós viraremos o que está acontecendo nos Estados Unidos hoje. Lá são necessários de cinco a sete anos para conectar à rede”, afirmou.

O alerta reforça a necessidade de planejamento energético e integração entre os setores elétrico e digital, de forma a antecipar a demanda e evitar gargalos que possam frear o crescimento da economia digital brasileira, especialmente em um momento em que o país busca atrair grandes provedores globais de computação em nuvem e inteligência artificial.

Planejamento e prioridade para o acesso à energia
Segundo Fialho, a disponibilidade de energia é o principal fator de viabilidade para novos investimentos em data centers, e não apenas o custo ou a localização geográfica. “Sem energia não tem data center. A discussão não é onde eu quero colocar o data center, mas onde eu tenho condições de colocá-lo. E onde não há condição, é preciso criá-la”, concluiu.

A fala reforça que o setor elétrico precisa se antecipar à demanda do setor digital, garantindo infraestrutura robusta e confiável para sustentar o crescimento do processamento de dados no país.

Especialistas defendem política industrial e tecnológica integrada
O moderador Luciano Charlita, do Banco Mundial, destacou que a localização dos data centers deve equilibrar demanda econômica e capacidade da infraestrutura elétrica. Ele lembrou que 80% da população brasileira vive em apenas 1% do território, o que intensifica a pressão sobre regiões já saturadas.

“A questão da localização dos data centers requer uma mistura de demanda econômica e capacidade da infraestrutura para permitir a instalação”, pontuou.

Já Giuseppe Marrara, vice-diretor de Telecomunicações da Abinee e diretor de Políticas Públicas da Cisco, ressaltou que o país precisa fortalecer sua indústria nacional de tecnologia para evitar gargalos de fornecimento e dependência externa.

“Os fabricantes brasileiros estão prontos para atender à demanda de equipamentos e soluções de automação, eficiência energética e conectividade de alta capacidade”, afirmou Marrara, acrescentando que isso depende de políticas públicas que garantam competitividade aos produtos locais.

Gargalo energético: o novo desafio da era digital
O alerta da Scala Data Centers expõe uma questão crítica para o futuro da infraestrutura digital e energética do Brasil. O crescimento vertiginoso da demanda por energia elétrica para data centers, combinado com os prazos longos de expansão da rede de transmissão, pode gerar um gargalo estrutural capaz de limitar a transformação digital e os avanços em inteligência artificial, computação em nuvem e 5G.

Para evitar esse cenário, será essencial um planejamento conjunto entre governo, reguladores e iniciativa privada, com foco em garantir energia limpa, estável e acessível para sustentar a nova economia digital.

Compartilhe: