Terça-feira, 5 de Agosto de 2025

A internet dos sentidos virá com o 6G

 Para se ter uma ideia do salto tecnológico que será representado pela chegada do sistema 6G, a velocidade deve ser multiplicada por mil. A capacidade de conexão de dispositivos, idem. Além da melhoria de parâmetros sobre o 5G – como velocidade, latência e densidade -, estão previstas a absorção de mais papéis pela rede e maior uso da inteligência artificial (IA) e da conexão com satélites para sustentar desde eficiência energética até a inclusão digital universal. Na prática, as características tecnológicas, conceituais e até sociais, elevam o 6G a um patamar inédito, que vai assegurar um universo digital interconectado. Não bastasse tudo isso, a nova rede de conexões deve ir além das telas. O acionamento por gestos ou fala e interfaces cria a internet dos sentidos, enriquecendo visão e audição e incluindo ainda tato, olfato e paladar. 

 Todas essas inovações fazem parte da agenda estabelecida pela União Internacional das Telecomunicações (ITU, na sigla em inglês), agência da ONU destinada a regular o setor em nível mundial. Mas outras organizações dedicadas à padronização na área, colaboradoras da ITU, avançam em paralelo. A agenda do 3GPP, por exemplo, organização voltada a padronizar criação, envio e reprodução de arquivos multimídia por dispositivos móveis, prevê uma reunião para discutir a padronização do setor no segundo semestre. Por aqui, as definições incluem a divisão da frequência de 6 GHz entre 6G e wi-fi pela Anatel, com expectativa de leilão da banda em 2026. 

 A perspectiva é que a partir de 2029 comecem a surgir ofertas comerciais de 6G em países mais avançados – China entre eles – e outros que já experimentam o 5G Advanced (ou 5,5G). Com o 6G, a latência despenca para microssegundos. Só isso já traz mais confiabilidade e novas capacidades para aplicações como vídeo, streaming e internet das coisas (IoT), incluindo mobilidade autônoma e indústria 4.0. 

 Algumas aplicações já começam a surgir parcialmente e se tornam nativas na nova geração, como a IA. Hoje, a tecnologia enriquece processos específicos das redes, mas com o 6G será nativa e embutida nas soluções. “O que os fornecedores trazem por conta própria fará parte dos documentos que definem as padronizações”, diz Carlos Lauria, diretor de relações governamentais e assuntos regulatórios da Huawei Brasil. 

 Com isso, elementos como monitoramento, gerenciamento, eficiência – no uso de espectro e energia, por exemplo – e custos ganham nova dimensão. Ações como o desligamento de equipamentos quando não utilizados (zero bite, zero watt) e melhoria da relação entre transmissão de informações e consumo energético devem ser universalizados. Segurança, inclusive cibernética, privacidade e sustentabilidade também farão parte do design. 

 Outra característica prevista é a ubiquidade. A disponibilidade em qualquer hora e lugar, sem interrupção ou perda de velocidade, implica multi conectividade, com apoio de redes de satélites. Também inédito é o papel da rede como sensor, com uso da radiofrequência empregada na comunicação para detecção do ambiente – como uma espécie de radar com posicionamento preciso em centímetros, em tempo real e com troca de informações entre objetos e pessoas, conectados ou não. 

 Com capacidade extrema de transmissão, hologramas 3D enriquecem desde o entretenimento até reuniões de trabalho, como a apresentação de projetos. Sensoriamento refinado e transmissão de enormes quantidades de dados em tempo real praticamente sem latência devem sustentar cirurgias remotas em que o médico sente a resistência dos tecidos manipulados. Tecidos inteligentes trarão a possibilidade de transmissão de um abraço à distância. 

 Tudo isso depende do desenvolvimento de tecnologias habilitadoras. Na NTT Docomo, empresa de telefonia celular do Japão, o sócio líder de telecomunicações, Marco Dalaz Carrasco, experimentou sensações distintas ao segurar uma bola de tênis, como abrir e fechar um zíper e tocar um carpete. “O cérebro vê a bola, mas a sensação é de tapete”, conta. Entre outros testes, a marca usa drones na Amazônia para analisar a interoperabilidade e a ampliação de cobertura, uma das metas do 6G. 

<span> O 6G trará a junção quase imperceptível do mundo físico com o digital” </span> — Edvaldo Santos 

 Experiências como a decomposição de moléculas responsáveis por sabores, com reconstrução em outro local, já são testadas por empresas como a Fill Tech, para transmissão de paladares a partir, por exemplo, de um copo de água. Outras conseguem fazer o mesmo com o olfato, por enquanto com máscaras capazes de criar ou eliminar aromas. “Tomei um shot com gosto de sopa de tomate”, descreve Henry Rodrigues, gerente executivo do Centro de Competência Embrapii Inatel em Redes 5G e 6G (xGMobile), cuja parceria com o Instituto Indiano de Tecnologia Mandi (IIT Mnadi), participante do 3GPP, visa inserir interesses do Brasil ao processo de padronização do 6G. 

 Pesquisas do Inatel relacionadas ao 6G incluem ampliação de cobertura de estações rádio base (ERB) para até 50 km, com uso de canais de TV digital não utilizados, transmissão de dados junto de luz e transmissão de energia elétrica por fibra ótica, além de uso da superfície refletora inteligente em ERBs para otimizar área e controle da cobertura. 

 “O 6G trará a junção quase imperceptível do mundo físico com o digital”, diz Edvaldo Santos, vice-presidente de P&D&I da Ericsson para o Cone Sul da América Latina. Segundo ele, esse hiperfísico contínuo inclui também a internet do pensamento, com interfaces cérebro-computador não invasivas e uso de vestimentas para acionar máquinas inteligentes conectadas, além de robôs e drones que trabalham coletivamente entre si e com seres humanos. 

 O uso de gêmeos digitais, atuadores para interferências e IA para aplicações como mobilidade e cidades inteligentes, traz infinitas possibilidades. Com o 6G, a interação em tempo real entre objetos não visíveis ou não conectados torna a autonomia veicular, terrestre ou aérea, mais avançada e segura, simplificando a interferência no ambiente a partir de um centro de comando. “Isso muda a demanda da rede, com mais envio de informações dos usuários”, afirma Hugo Baeta, diretor de vendas e gestão de negócios da divisão de Mobile Network. 

 

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