Tecnologia ajuda no combate à indústria do celular ilegal
O Globo - 08/04/2024

Há no Brasil 250 milhões de celulares, mais de um por habitante. Mais que bem de primeira necessidade, o aparelho virou motivo de preocupação. Quando alvo de ladrões, expõe informações pessoais, contas bancárias, cartões de crédito ou identidades digitais. Em 2022, último ano com dados consolidados, quase 1 milhão de celulares foram furtados no Brasil, 16% a mais que em 2021. O mercado de aparelhos ilegais também não para de crescer. No último trimestre de 2023, os celulares oriundos de furto ou contrabando representaram 25% das vendas, segundo pesquisa divulgada pela Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee). Há um ano respondiam por 10%.

Surgiram quadrilhas especializadas em lidar com os celulares surrupiados. Mesmo bloqueados, eles podem fornecer peças ou ser contrabandeados para países africanos, onde o bloqueio não é reconhecido pela rede de telecomunicações. O universo criminoso também inclui vídeos espalhados na internet, com dicas sobre como lidar com os aparelhos roubados. A maior parte é vendida em sites que não se responsabilizam pelas vendas de terceiros. Os preços irrisórios são impraticáveis para distribuidores que atuam dentro da lei. De acordo com a Abinee, o governo federal perde R$ 4 bilhões em impostos por ano com a indústria do celular ilegal, e só o estado de São Paulo deixa de arrecadar R$ 1 bilhão em ICMS.

No combate a essa modalidade de crime, a tecnologia tem sido o principal aliado das autoridades. Em dezembro, o governo lançou o programa Celular Seguro, que permite bloquear, pelo aparelho de uma pessoa de confiança, a linha telefônica, os aplicativos bancários e o identificador único do celular furtado ou extraviado (conhecido pela sigla IMEI). A partir daí, ele não pode mais ser habilitado por nenhuma operadora. Em apenas uma semana, o Celular Seguro bloqueou 4.349 aparelhos roubados ou perdidos.

Mas isso não significa que os furtos tenham parado. De janeiro de 2023 ao início do ano, apenas em São Paulo houve 640 prisões por envolvimento na indústria de furto, receptação e venda criminosa de celulares, segundo a Secretaria de Segurança Pública paulista. São quase duas por dia. Uma quadrilha investigada invadia contas bancárias e vendia peças de aparelhos. Apenas com ela, a polícia recuperou mais de 800 celulares. Um suspeito foi preso com mais de 50 numa mochila.

Nenhuma iniciativa contra o furto de celulares tem chamado mais a atenção que a promovida pela polícia do Piauí. O estado reduziu em 31% os roubos e furtos com base na identificação de celulares surrupiados que voltaram a ser habilitados. Uma parceria com o Judiciário permite o envio em massa de intimações a aparelhos de origem suspeita. Em oito meses, foram recuperados quase 6 mil celulares, mil deles devolvidos aos donos em um só dia. Os policiais também já fecharam 65 lojas envolvidas na receptação. O Ministério da Justiça anunciou que pretende disseminar pelo país as práticas do Piauí, um caminho promissor para combater a indústria do celular ilegal.