Acordos ajudam a cumprir metas de logística reversa
Valor Econômico - 31/10/2024

 O custo e a abrangência de pontos de coleta em um país com dimensões continentais são desafios para ampliar a logística reversa de materiais pós-consumo que inclui o processo de reciclagem e seu reaproveitamento em outros ciclos produtivos. A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), criada em 2010, incentivou acordos setoriais por meio de gestoras responsáveis pelo recolhimento e destinação dos produtos, com a adesão de dez entidades registradas no Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos (Sinir). O desafio dessas gestoras é conseguir alcançar as metas com as quais estão comprometidas. 

 Um dos resíduos que mais crescem no mundo é o eletroeletrônico, com uma reciclagem menor que 3%. Nas Américas, o Brasil é o segundo maior gerador desse tipo de resíduo, atrás apenas dos Estados Unidos, segundo a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), que criou a gestora de logística reversa Green Eletron. 

 “Nesse modelo coletivo, a gestora desenvolve o sistema e divide os custos entre as empresas associadas, proporcional à quantidade de produtos colocados no mercado”, explica Ademir Brescansin, gerente-executivo da Green Eletron, que conta com a adesão de 114 empresas. A entidade é responsável pela coleta, transporte, desmontagem e reciclagem dos produtos entregues pelos cidadãos nos pontos de entrega voluntária (PEVs) e que se transformam em novas matérias-primas para a indústria. 

 O programa define a obrigatoriedade de instalar cinco mil coletores nas 400 maiores cidades do Brasil entre 2021 e 2025 e destinar uma porcentagem (em peso) dos produtos inseridos no mercado. “Em 2024, a meta é de 12%, e cresce progressivamente até chegar a 17% em 2025, diz Brescansin. No ano passado, a Green Eletron enviou para reciclagem 4.279 toneladas de equipamentos eletroeletrônicos e 161 toneladas de pilhas e baterias e instalou 1,2 mil PEVs em 305 municípios em vários Estados. 

 Entre os resíduos com alta taxa de reciclagem está o aço, com a média mundial chegando a 87%. “A demanda global, no entanto, é três vezes maior, exigindo a continuidade da extração do minério de ferro”, diz Bernardo Rosenthal, diretor de compras de metálicos da ArcelorMittal Aços Longos. O grupo reprocessa globalmente 30 milhões de toneladas de aço por ano e três milhões no Brasil. 

 O aço produzido contém de 25% a 100% de material reciclado, de acordo com a qualidade e as especificações do produto final. Segundo Rosenthal, nos últimos três anos, a ArcelorMittal comprou por volta de 8 milhões de toneladas de sucata. “A linha que utiliza resíduos em sua fabricação tem 40 coprodutos – artefatos de concreto, aterros rodoviários, corretivos agrícolas e revestimento primário de vias urbanas e rurais”, afirma. 

 A empresa conta com um programa especializado em sucata veicular, que, além da etapa de descontaminação – retirada dos elementos não ferrosos contaminantes, como fluidos, bateria e pneus –, segue até a destinação final com garantia de que os materiais ferrosos serão usados como matéria-prima no processo produtivo do aço e os contaminantes serão descartados em parceria com empresas especializadas em cada produto. 

 No segmento de embalagens, o PNRS prevê um aumento progressivo na recuperação e tem como objetivo reciclar 32% em 2025, chegando a 50% até 2050. “Temos apenas dois ou três anos de mensuração da reciclagem no Brasil após a implementação da lei em 2021, sem mudanças significativas no índice principalmente pela falta de fiscalização: ou não há, ou só acontece em alguns Estados, e é limitada às indústrias que produzem nessas regiões”, afirma Renato Paquet, CEO da Pólen, empresa que oferece um sistema de rastreamento de produtos por meio de um QRCode para o acompanhamento das etapas pós-consumo. Dados de uma pesquisa da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe) referente a 2022 mostram que a porcentagem de recicláveis estava em 16,8% de plásticos, 10,4% de papel e papelão, 2,3% de metais e 1,4% de embalagens multicamadas (estruturas compostas por diversas camadas de materiais como alumínio, plástico e papel). 

 Paquet destaca que, apesar de a PNRS estabelecer a responsabilidade compartilhada entre importadores, distribuidores, comerciantes e fabricantes de produtos embalados, na prática quem arca com o custo da logística reversa é a indústria, que o repassa ao consumidor. 

 O aumento de pontos de recolhimento das embalagens também está entre as prioridades da Nespresso, do grupo Nestlé, para alcançar 60% na taxa global de reciclagem até 2030, sendo que no Brasil processa um quarto do volume vendido. “Os consumidores podem descartar as cápsulas em mais de 400 pontos de coleta espalhados no país, pelos Correios e pelas empresas no momento do recebimento do pedido”, explica Marina Gargiulo, gerente de marca, comunicação e sustentabilidade da Nespresso. 

 As cápsulas vão para o Centro de Reciclagem da Nespresso, no município de Osasco, na Grande São Paulo, onde a borra do café é mecanicamente separada do alumínio, sem a utilização de água, e retorna para a cadeia de valor da matéria-prima, onde são transformadas em peças automotivas, bicicletas, computadores ou latas de refrigerante. “A borra do café é reutilizada na produção de compostos orgânicos ricos em nutrientes por meio do projeto Nespresso Hortas”, ressalta Gargiulo. 

 A Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) lançou em outubro o Painel Dinâmico Logística Reversa, um portal que compila e classifica dados de logística reversa de 2012 até 2023 com informações de 10,1 mil empresas de 18 setores industriais. Em 2023 o sistema registrou a reciclagem de 820 mil toneladas de resíduos – 34% correspondem a pneus, 28% a embalagens em geral, 19% a óleo lubrificante acabado e 17% a baterias de chumbo-ácido no Estado de São Paulo. 

 “O setor com mais empresas aderentes aos termos de compromisso de logística reversa é o de embalagens em geral, que corresponde a 70% das empresas”, afirma Liv Nakashima Costa, diretora de gestão corporativa e sustentabilidade da Cetesb. Dos 645 municípios paulistas, 558 possuem algum tipo de instalação de logística reversa. A adesão ao portal e o envio de informações se dão principalmente pelas empresas que fazem o pedido de licenciamento ambiental à Cetesb.